Tiramisù… sobremesa tipicamente italiana com as suas camadas de biscoito embebidas em café forte mas na dose certa, com o seu recheio de queijo mascarpone e natas, e o subtil aroma de vinho rematado com uma fina camada de cacau… Uma sobremesa adulta para os paladares mais requintados.
As sobremesas sem forno de Agosto: Take 1
E eis que chegou o mês de Agosto! Para muitos, o mês de férias tão desejado! O mês em que se carregam baterias, em que se reúnem famílias, em que os dias são mais longos e mais quentes e nos proporcionam passeios no campo ou à beira mar e juntar os amigos e familiares em longos jantares onde a animação é garantida.
Em Agosto decidimos dar folga ao forno aqui no estúdio e lançámos para o ar o desafio de fazer somente sobremesas sem forno e se à partida pensámos: piece of cake! Rapidamente percebemos que para fazer acontecer teríamos de ser flexíveis com algumas das nossas ideias pois para quem gosta de fazer tudo de raíz como nós, dificilmente se conseguem fazer doces e sobremesas sem ligar o forno…
Mas o desafio estava lançado: sobremesas sem forno, este só volta a trabalhar em Setembro! Guardadas para outra altura ficam as receitas dos palitos la reine, das bolachas digestivas e tudo o resto que precise de forno porque este é, para muitos, um mês que se vive “a_gosto” a um ritmo que se quer mais lento, saboreando muito mais cada momento.
Tiramisù
O que é o Tiramisù? Foi o ponto de partida nesta viagem que começa num dicionário italiano onde vamos encontrar esta descrição:
Tiramisù:
- o tirami su, n.m. invar. dolce semifreddo preparato con pan di Spagna, mascarpone, uova e zucchero, e ricoperto da un sottile strato di cacao * doce semifrio, preparado com pão de ló, mascarpone, ovos, açúcar e coberto com uma fina camada de cacau.
- Comp. dell’imp. di tirare, il pron. pers. mi e la prep. su; così chiamato con allusione alle sue proprietà energetiche * (…) puxa-,me (…) assim chamado com alusão às suas propriedades energéticas.
Já tinha lido várias histórias sobre a origem do Tiramisù e como acontece com quase todos os doces ou sobremesas com alguma antiguidade, existem várias versões que muitas vezes se traduzem em diferentes receitas para o mesmo doce, bolo ou sobremesa.
O Tiramisù não é excepção e há quem defenda que o original é feito com pan di Spagna ou pão de ló, tal como menciona a descrição do dicionário, mas também há quem defenda que é com palitos de champagne, outros vão dizer que o certo é La Reine, e o mesmo vai acontecer para a bebida alcoólica a utilizar havendo receitas que pedem vinho Marsala, Porto, Rum, Amaretto ou vinho Madeira alegando que essa é a melhor escolha.
Quando uma receita tem muitas versões há algo em mim que sem querer vai atrás do motivo: o que aconteceu ou o que originou outra receita? Qual é afinal a receita original? E não é que ache importante ou que sinta que há uma que vale mais que as outras, não é nada disso, é o perceber a história por detrás da receita: como nasceu e o que fez acontecer, ou quais os acontecimentos que geraram as variações que depois se lhe seguiram.
Ainda não tenho a resposta certa para estas questões, mas a realidade é que quanto mais estudo pastelaria, mais claro se torna na minha cabeça que:
- Vivemos numa era sem igual! é fácil hoje, procurar o que quer que seja e escrever o que quer que seja para muitos lerem, registarem, guardarem para memória futura, devidamente datado e fundamentado. Em vários formatos, audio, virtual, em livros, revistas… mas ainda é relativamente recente o passado em que nada disto havia. Eram poucos os livros e preciosos o que tornava o conhecimento gastronómico muito mais limitado.
- A pastelaria é sem dúvida uma arte. Para uns um livro aberto. Para outros um livro fechado a 7 chaves, pois o segredo é a alma do negócio. E é muito por causa deste livro fechado que surgem várias versões de receitas para o mesmo produto. A doçaria conventual portuguesa ensina-nos isso mesmo, pois sabemos que muitas das receitas eram passadas só oralmente e sob compromisso de manter segredo para que não passassem para o mundo exterior, surgindo pequenas variações aquando da mudança para outros conventos ou aquando da tentativa de reprodução do doce que até então era feito por outra pessoa. Sem escrito e quantidades certas, era a intuição que entrava ao serviço.
Outra causa para as variações são os produtos disponíveis para a confecção do doce, bolo ou sobremesa, e aqui há muitas razões:
- escassez, como aconteceu aquando das guerras mundiais em que muitos produtos alimentares foram racionados e outros deixaram mesmo de se conseguir encontrar,
- a mudança de país e se hoje temos a facilidade de comprar quase tudo pois vivemos numa economia aberta, ainda há poucos anos não era bem assim e só quando se voltava ao país de origem se conseguia obter a tão desejada matéria prima, com o sabor que a caracteriza…
- e a matéria prima que há disponível no local em que estamos, pois quando nos passam uma receita que nos é dita merecedora de fazer, se não há vinho marsala, por exemplo, vamos tentar substituir pelo vinho que tenhamos à mão e que seja o mais próximo da descrição. Em exemplo perfeito desta necessidade e também capacidade de adaptação é a história do Salame de Chocolate, que atravessa continentes adaptando-se às realidades de cada país.
Por último os gostos de cada um de nós, que quando gostamos muito da maioria dos elementos duma receita, mas há um que nem por isso, rapidamente solucionamos o problema, dando-lhe o nosso cunho. Alterando ligeiramente, e criando assim outra versão, que passa a ser para nós a melhor.
E no fim de contas, é isso mesmo que importa! É a receita ir de encontro ao nosso paladar e ser possível de confeccionar com os ingredientes que temos disponíveis, obedecendo como é expectável à sua essência. No fundo a receita que hoje partilho convosco é resultado disto mesmo, nunca comi um Tiramisù feito por uma nonna (avó) italiana ou sequer em Itália, logo todas as minhas referências são versões adaptadas por alguém até que cheguei à minha que é o Tiramisù mais português que já comeste 😉 e que garante a utilização dos ingredientes essenciais do Tiramisù.
Tiramisù e um pouco de história
O Tiramisù é uma das sobremesas mais conhecidas no mundo, no entanto não se conhece a sua verdadeira origem e há registos bem diferentes entre si. Conta-se que é originária de Treviso criada pelos proprietários do restaurante Le Beccherie por volta de 1971 e de como estes sentem pena por não terem registado a receita, evitando assim tantas variações.
Mas, (há sempre um mas!) há uma versão anterior que conta que o Tiramisù se apresentou ao mundo na década de 60 (1960) resgatado dos bordéis italianos (que tinham ao serviço conceituados chef´s e que dadas as propriedades energéticas deste doce, era servido como mimo pelas empregadas do estabelecimento) pela mão dos proprietários do restaurante Da Alfredo e que nunca reivindicaram a sua criação remetendo-a à origem (os bordéis).
Há ainda uma versão que conta que o Tiramisù nasceu no século XVII, quando Cosimo III de Médici (1639-1723) assume o cargo de grão-duque da Toscana e pela sua passagem em Siena, os Chef´s criaram um doce à sua imagem: nobre, grandioso e ao mesmo tempo simples. O grão-duque agradado com com tal doce levou-o para a corte que a todos conquistou.
E agora? Qual será a sua origem? Acho que continuaremos sem saber muito bem 😁 Um dado curioso, no entanto é que nesta pesquisa não encontrei menção à utilização de vinho nas receitas referidas como mais antigas, ele só aparece quando se passa a fazer o zabaione, ou zabaglione em italiano, e pede por vinho Marsala ou Porto. Como em qualquer doce, a utilização de bebidas alcoólicas é completamente facultativa, mas neste caso o zabaione é totalmente recomendado pois assim evitamos possíveis problemas com salmonela vinda de ovo cru. Só a titulo de curiosidade, o zabaione é o nome que se dá ao doce que resulta das gemas batidas com o açúcar em banho maria, com o vinho até engrossar pois voltaremos a ele numa outra ocasião.
Como o primeiro registo escrito desta receita surge nos anos 80 (1980) prevalece a história de que a sua origem é em Treviso, se resgatado das casa chiusa (bordeis) ou criado pelos proprietários do restaurante Le Beccherie é que não sabemos.
O que sabemos é que o Tiramisù é uma sobremesa elegante mas com carisma com a base de biscoito embebida em café, coberta com um muito suave creme de queijo mascarpone, ovos e natas, aromatizado com um vinho doce e finalizado com uma fina mas generosa cobertura de cacau e que esta é a nossa receita esta semana.
Video: Receita de Tiramisù
Receita de Tiramisù
Preparação:
15 minutos
Rendimento:
12 fatias
pronto em:
30m + 4h frio
Ingredientes:
Calda de café para molhar os biscoitos:
- 300ml água
- 20/25gr de café solúvel ou 4 expressos
- 25gr açúcar
Creme:
- 60gr açúcar
- 3 gemas – Encontra aqui: receitas para utilizar as claras que sobram
- 60ml vinho Porto Branco* (ver notas)
- 250gr queijo mascarpone
- 200ml natas de para bater
- 1 colher de sopa de cacau em pó.
- Para esta receita vais precisar de cerca de 200gr de biscoitos de champanhe, ou palitos la reine.
Como Fazer:
Calda de café para molhar os biscoitos:
- Levar os 300ml de água ao lume até levantar fervura.
- Colocar num recipiente sobre o café., adicionar o açúcar, misturar e reservar, para que arrefeça um pouco. *(ver notas caso optes por expresso)
Creme:
- Preparar o banho maria, de forma a que a taça não toque na água.
- Colocar as gemas e bater, adicionar o açúcar em 3 inclusões, batendo sempre. Na última inclusão de açúcar, adicionar o vinho escolhido e bater até que fique fofo e esbranquiçado. O ideal é conseguir atingir os 60ºC, para que seja mais seguro comer este creme com gemas cruas. Idealmente com um termómetro de cozinha, no entanto por norma, atingimos esta temperatura quando a água começa a ferver.
- Bater as natas até ponto firme.
- Bater o queijo mascarpone até que fique cremoso.
- Envolver as natas no queijo e misturar só até que fique homogéneo.
- Por fim, envolver a mistura de natas e queijo marcarpone no batido das gemas (zabaione), misturando bem para que continue cremoso.
- Demolhar os biscoitos rapidamente para que não ensopem muito café, e forrar a base do tabuleiro.
- Colocar metade do creme.
- Cobrir com outra camada de biscoitos embebidos em café.
- Colocar o restante creme e finalizar, polvilhando com cacau em pó.
Notas:
- O café não deve estar muito quente, ou desfaz os biscoitos. O ideal é que esteja morno.
- Caso prefiras café expresso, precisarás de 4 ou 5, (podes fazer a gosto, mais ou menos intenso) certifica te que tens no mínimo 250ml, e também deves deixar arrefecer até que fique morno.
- *Vinho do Porto Branco, foi a nossa escolha mas podes optar por Rum, Amareto, Vinho Marsala ou Madeira.
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Nesta receita utilizei:
Café Solúvel: Delta
Queijo Mascarpone: Galbani
Nata Cremosa: Mimosa
Cacau em Pó: Callebaut
Termómetro de Cozinha: Digital
Referências:
Dizionari Italiano: Tiramisù
Wikipédia: Tiramisù
The History of Tiramisù
Il Tiramisu’ Legittimo delle Beccherie: Recipe
Vinho Marsala
L´art Del Tiramisù